O Notalatina volta hoje com um artigo do Carlos Reis, inspirado e reflexivo. O tema que ia abordar era outro, mas preferi dar passagem a esse, pois, depois de amanhã, o Brasil nunca mais será o mesmo.
A partir de amanhã, não estaremos vivendo a “vitória da democracia” como vem apregoando toda a mídia e a massa ignara fazendo coro, mas estaremos entrando, com poucas chances de retorno, na “kali yuga”, no tempo das trevas. O povo assim quis, pois assim será...
TERROR
A mais importante transformação que um controle governamental amplo produz é de ordem psicológica, é uma alteração no caráter do povo. Isso constitui um processo necessariamente lento, que se estende não apenas por alguns anos, mas talvez por uma ou duas gerações.
Friederich Hayek, O Caminho da Servidão.
Chico Buarque de Holanda hoje é uma pálida sombra do grande artista criativo que foi. Sua poesia, sua melodia, sua até, para nós, inconveniente genialidade, hoje decaíram. Mudou o Chico? Ou mudou o Brasil? Ambos mudaram. Chico perdeu a inspiração, e pronto. Foi isso o que aconteceu. Vive até hoje do Ibope que deu há décadas. Era viciado em gases tóxicos, o que lhe dava extraordinária energia criativa. Mal comparando, era parecido com Gramsci, que encontrou no cárcere mal-cheiroso de Mussolini suficiente inspiração para orientar intelectualmente uma revolução e pô-la por escrito.
Hoje respiramos uma mistura atmosférica que alguns chamam liberdade ou democracia. Alguns não, a maioria. Esse ar que parece puro (já o foi muito mais) parece intoxicar negativamente criadores do tipo Chico Buarque. Mal comparando de novo, ele parece-se com aquelas bactérias anaeróbicas que morrem asfixiadas pelo oxigênio puro. O ar da liberdade é fatal para seres anaeróbicos antes tão fecundos e criativos.
Mas não é de Chico Buarque que quero falar, e sim de nós mesmos. Esse “nós mesmos” é exatamente isso: nós mesmos, aqueles que hoje, já respirando um ar crescentemente viciado, em plena democracia publicitária (Platão se espantaria com esta teatrocracia moderna!), estão a construir textos cada vez mais acurados e plenos de emocionada exatidão sobre o terror petista, pois que emoções se têm como sempre exatas, previsíveis, definidas, e limitadas pelo sentir humano, diferentemente do intelecto e da razão sempre dialeticamente infinitas. Isso é uma autocrítica. Eu mesmo me sinto, sem modéstias falsas, por favor, um desses autores dotados de absoluta acuidade sensorial e emocional, legitimamente compungido a detectar a ameaça terrorista totalitária.
Já temos até a primeira Tchecá petista real, um departamento chamado, talvez provisoriamente, “Grupo de Repressão a Atos de Intolerância”, GRAI, um assustador nome de uma nascente instituição criminosa partidária, embrião maligno já em atividade de algum departamento estatal. Ela já está se tornando para nós, pelo menos por enquanto, o paradigma do totalitarismo petista que ainda nem ascendeu ao poder.
Estou com aquele pressentimento que vêm aí textos e mais textos, artigos e mais artigos, de extraordinária criatividade culinária e literária, explorando as diversas dimensões humanas, mas especialmente a dimensão psicológica, todos revelando ao deserto brasileiro povoado de almas esvaziadas que marcham uniformemente, majoritariamente, as várias formas do horror, da censura, e da prepotência totalitária. Falaremos e escreveremos sobre psicologia, psiquiatria, biologia; falaremos e escreveremos sobre a alma humana inúmeras vezes, do indivíduo e seus mistérios, e de aberrações e bestialidades várias. Nossos assuntos se cingirão a revelar, ainda que de forma poética, as mais variadas formas do terror político, a mentira institucionalizada, a organização para o crime, e a violência estatal, a justiça postiça e seus tribunais “kangaroos”.
Depois de Cidade de Deus - obra-prima fascista eleita já no primeiro turno, o nosso Encouraçado Potenkim, e que por isso merece ser premiada com o Oscar do nosso tempo -, e que, mais do que a eleição de Lula, considero um marco importante e diagnóstico da psicopatologia brasileira, estaremos finalmente no ambiente intelectual alemão dos anos 20 e 30, de Fritz Lang e seus monstros, a Carl Schmitt e sua esfera única Sociedade-Estado. Daqui a dois meses estaremos vivendo a atmosfera orwelliana do Ministério da Verdade, a continuação do Ministério da Paz e do Amor da campanha eleitoral. Depois será a abundância e as estatísticas grandiosas do pai-Estado, gritantemente contrárias às imagens esquálidas de brasileiros famintos de pão e liberdade.
Estamos, “nós mesmos”, a ponto de realizar e inaugurar outro período histórico de resistência ao pensamento totalitário no campo da cultura e do pensamento, com a diferença que dessa vez faremos isso em plena guerra. E eu que sempre me lamentei de não ter vivido a época da Segunda Guerra Mundial, ou da ascensão do nacional-socialismo (!), de não ter podido viver aquele momento incrível de contradição intelectual e cegueira filosófica que concorreu para arrastar o mundo à violência coletivista. Terei agora a minha chance! Ah, meu Deus, quanto me falta Poesia, Filosofia e História, e as demais geometrias da natureza humana para lutar essa guerra
Carlos Reis
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