terça-feira, 23 de dezembro de 2008


A cidadã blogueira

Na última edição do Notalatina eu havia prometido que na próxima falaria da Argentina, seus escândalos, crimes políticos, corrupção. Não desisti disso e tenho uma entrevista-bomba, na verdade, uma confissão de culpa de um crime cometido em 2005 e que só agora veio à luz, depois de denunciado num livro. Entretanto, recebi mais um artigo a respeito da blogueira “cubana de Cuba”, Yoanis Sánchez, que não posso de modo algum calar, malgrado a receptividade que teve a primeira denúncia e onde fui achincalhada, rotulada de invejosa, incompetente, difamadora e caluniadora. Só faltou dizerem que cometi algum crime previsto em lei contra a donzela pura, santa e imaculada.

Volto a bater nesta tecla porque a autora deste artigo é uma pessoa absolutamente idônea, séria, respeitadíssima e que esteve presa na “Primavera Negra de Cuba”, portanto, sentiu na própria carne o gosto do chicote àqueles que se insurgem contra o regime, e só há muito pouco exilou-se nos Estados Unidos; portanto, é uma “cubana de Cuba” também. Ademais, faço-o por um dever de consciência para com a verdade e, àqueles que preferem se iludir com as aparências e para quem fatos são um mero detalhe sem importância, respondo que estou me lixando; faço o que me compete fazer, por mais incômodo que seja.

Não existe nesta maldita história escrita com o sangue dos mártires há cinqüenta anos, nenhum FATO semelhante ao desta blogueira que tivesse ficado impune. A forma arrogante como ela refere ter deixado a delegacia quando foi intimada “apenas” para ser notificada de que não poderia realizar o encontro dos blogs é, por si só, um fato alarmante. Não se conhece um só opositor que tivesse sido tão desaforado com os interrogadores e que não tivesse – no mínimo – levado uns bofetões de arrancar os dentes e em seguida jogado no calabouço da Villa Marista. Mas Yoanis disse o que quis e saiu ilesa, inclusive saudada pela rede inteira como “heroína”. Agora afronta ninguém menos que a filha do ditador hereditário substituto e não passa nada? Ah, me poupem porque, como bem diz Adela Soto, nem um rapaz imberbe engole esta farsa!

Deixo com as consciências de cada um a escolha de: querer conhecer a verdade, ou iludir-se com a farsa servindo ao regime criminoso que dizem combater, como dóceis idiotas úteis. Eu sei de muito mais coisas mas tudo a seu tempo; a verdade um dia vai ofuscar a todos com seu clarão de luz.

E como amanhã é véspera de Natal, o Notalatina deseja a todos uma noite de paz, fraternidade, amor e concórdia, pois festejamos o nascimento deste Menino-Deus pré-eterno, nosso Senhor e Salvador. Que Ele esteja em todos os lares e no coração de cada um. Fiquem com Deus e até a próxima!

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A CIDADÃ BLOGUEIRA
*Adela Soto Álvarez

Cada noticia sobre a “cidadã blogueira” Yoanis Sánchez me deixa mais confusa e repito que não é porque tenha nada contra ela pessoalmente, mas porque suas possibilidades e liberdade de movimentos chegam a pôr em dúvida a qualquer pessoa, por imberbe que seja; imaginem então um opositor ou jornalista independente cubano que tenha sofrido ou sofra na própria carne a repressão, a perseguição, a humilhação e a tortura psicológica que o regime castrista aplica aos que discordam de seus ditames.

E me refiro à publicação do dia de hoje na página digital “Cubaencuentro”, onde sob o título “Mariela Castro acusa a blogueira Yonis Sánchez... e a chama de galinho insignificante entre outros qualificativos”, sendo isto o resultado do acontecido em dias anteriores no Museu de Belas Artes na cidade de Havana, quando se afirmou pela própria blogueira através de seu espaço digital e na filmagem em vídeo enviado ao exílio, de quando interpelou a filha do mandatário Raúl Castro em meio de uma conferência de abertura social.

Alguns meios do exílio catalogaram a Yoanis por este incrível incidente “público” de demonstrar muito mais valentia do que os dissidentes políticos, esquecendo a luta em honra da liberdade e o encarniçado enfrentamento que conduzem os opositores pacíficos, a imprensa independente e os presos políticos e de consciência cubanos. E sem contar a quantidade de homens e mulheres que perderam suas vidas na tentativa, e os que vivem fora de sua Pátria por causa das injustiças da ditadura.

Quem conheça o aparato repressivo da ilha sabe que o ocorrido no Museu de Belas artes dias atrás deixa muito a dizer, pois ninguém pode esquecer que Mariela Castro é da família dos intocáveis e, portanto, embora queira dar mostras de abertura em temas sociais como o homossexualismo, nunca o fará em assuntos ideológicos e muito menos de corte político.

Todos os que vivemos e sofremos o regime dos Castro sabemos que todas as atividades públicas são custodiadas pelo pessoal da Segurança do Estado; imaginem então onde participe algum membro do aparato governamental?

Por isso considero impossível que uma pessoa que realmente esteja fichada por suas manifestações contestatórias, que tenha sido premiada uma infinidade de vezes por isso e que esteja em primeiro plano em quase todos os jornais independentes do exílio e Europa, inclusive televisões e emissoras de rádio governamentais, possa interpelar abertamente a um membro oficial sem ser presa de imediato pela polícia política.

O que é mais de se admirar em todo este caso, é como a Diretora do Cenesex responde à opinião de um usuário sobre a pergunta da blogueira Yoanis, através de uma página web, e que este fato fique impune ante o regime o qual, por muito menos, mantém a mais de 22 jornalistas independentes morrendo na inclemência penitenciária.

É doloroso ver como se criam e utilizam objetivos humanos com o interesse de diminuir os que informam diariamente a realidade cubana, a falta de liberdades, a repressão e a perseguição continuada, pelo qual considero tudo isto um descrédito à oposição pacífica e à imprensa independente, e muito mais quando lembro depois da Onda Repressiva de 2003, a morte por pena capital imposta a três jovens por tão só tentar sair do país. Sanção que foi cumprida de imediato “como um escarmento”, como expressa com orgulho o chanceler cubano Felipe Pérez Roque, cada vez que se toca no assunto.

É impossível esquecer a recente greve de fome do jornalista independente Guillermo Fariñas, onde chegou à desnutrição total e quase perde a vida por expor-se ao jejum, com o objetivo de que o regime cubano permitisse à oposição pacífica o acesso à internet, jejum que resultou em vão porque este serviço nunca foi autorizado.

As múltiplas detenções e cativeiro de Antúnez, os maus tratos psicológicos a Gloria Amaya, mãe dos Sigler Amaya, as calúnias e maus tratos às Damas de Branco, as súplicas de Blanca, pedindo internacionalmente que intercedam por seu filho Normando Hernández, prisioneiro político que está morrendo no presídio sem atenção médica. E como este, um sem-número de homens que são maltratados por exigir seus direitos.

Tampouco podemos esquecer as prisões massivas que se produzem ano após ano, nas vésperas do dia dos Direitos Humanos, somente por celebrar um dia mundial ou portar uma carta da qual Cuba é co-signatária. Ou simplesmente por reunir-se ou jogar flores no mar em comemoração a alguma data alegórica. Ou ainda as confiscações que a Aduana da República realiza às doações de livros que o mundo faz para as bibliotecas independentes denominando-as “Literatura Proibida”, entre elas livros de literatura infantil e a Carta Universal dos Direitos Humanos.

São muitos os exemplos de repressão a expor; por desgraça não cabem neste artigo, porém por todos eles me pergunto: como é possível que as personalidades políticas e intelectuais de países democráticos, incluindo com grande incidência Miami, que mostraram grande inconformidade quando da Onda Repressiva da Primavera Negra, onde foram detidos e condenados à pena máxima opositores pacíficos, bibliotecários e jornalistas independentes, tão somente por discordar do regime cubano, não lembrem que destes, cinqüenta e nove ainda continuam nas masmorras da tirania por causas muito inferiores às que pretendem promover ao mundo através das muito bem confeccionadas e dirigidas proezas da blogueira Yoanis Sánchez?

quem duvida de minhas palavras os convido a que se remetam aos fatos repressivos contra o povo cubano durante todo o processo totalitário de mais de cinqüenta anos de ditadura, e assim possam tirar suas próprias conclusões.

* Adela Soto Álvarez é licenciada em Filologia, Jornalista, Escritora, Poeta. Fundou a Imprensa Independente em Cuba e foi condenada a um ano de privação domiciliar na Primavera Negra de 2003, por suas atividades contestatórias. Reside atualmente em Miami como refugiada política. Autora da novela-testemunho “O Império da Simulação” (Miami 2005) e outros livros sobre a realidade cubana.


Comentários e Tradução: G. Salgueiro